No dia 18 de setembro de 2025, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 7.265, que discutia a natureza jurídica do rol de procedimentos da Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). A decisão, relatada pelo Ministro Luís Roberto Barroso, trouxe novos parâmetros para a cobertura de tratamentos fora do rol da ANS, tema que vinha gerando grande insegurança jurídica nos tribunais e afetando diretamente milhões de beneficiários de planos de saúde em todo o Brasil.
O contexto da controvérsia
O rol da ANS é a lista de procedimentos mínimos que os planos de saúde são obrigados a cobrir. Durante anos, existiu intenso debate jurídico: esse rol seria taxativo, limitando a cobertura apenas ao que está expressamente previsto, ou exemplificativo, permitindo que outros procedimentos pudessem ser incluídos pela via judicial.
O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2022, havia firmado entendimento de que o rol era taxativo, mas com exceções em situações específicas, como a comprovação científica da eficácia do tratamento ou a ausência de alternativa terapêutica adequada. Pouco depois, o Congresso aprovou a Lei nº 14.454/2022, que alterou a Lei dos Planos de Saúde (Lei nº 9.656/1998) para obrigar a cobertura de procedimentos não incluídos no rol, desde que preenchidos determinados requisitos.
Essa mudança gerou questionamentos de constitucionalidade, levando a matéria ao STF.
O voto do Ministro Barroso
O Ministro Luís Roberto Barroso reconheceu que o § 12 do artigo 10 da Lei nº 9.656/1998, que define o rol como referência básica de cobertura, é constitucional. Contudo, em relação ao § 13 — que prevê a cobertura de tratamentos fora do rol — o relator entendeu que a redação legal era vaga e abria margem para decisões judiciais sem critérios técnicos uniformes, o que poderia comprometer a previsibilidade contratual e o equilíbrio econômico da saúde suplementar.
Para evitar esse risco, Barroso propôs uma interpretação conforme à Constituição, estabelecendo cinco requisitos cumulativos que devem ser observados para que um tratamento fora do rol seja de cobertura obrigatória. São eles:
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Prescrição por médico ou odontólogo assistente habilitado;
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Inexistência de negativa expressa da ANS ou pendência de análise em proposta de atualização do rol (PAR);
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Ausência de alternativa terapêutica adequada já listada no rol da ANS;
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Comprovação de eficácia e segurança do tratamento com base em evidências científicas de alto nível, como ensaios clínicos randomizados ou meta-análises;
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Registro do tratamento ou medicamento na Anvisa.
O papel do Judiciário após a decisão
Outro ponto importante do voto é a definição dos limites da atuação do Poder Judiciário. O STF determinou que o juiz não pode conceder cobertura com base apenas em um relatório médico apresentado pela parte. Agora, será obrigatória a consulta ao Núcleo de Apoio Técnico do Judiciário (NATJUS) ou a especialistas com expertise técnica, sempre que disponíveis.
Além disso, a decisão judicial deve comprovar que o beneficiário fez um pedido prévio à operadora, com a devida negativa, omissão ou mora irrazoável. Caso o juiz defira a cobertura, deverá ainda oficiar a ANS para avaliar a possibilidade de inclusão do tratamento no rol.
Impactos práticos para os consumidores
Na prática, a decisão significa que a cobertura de tratamentos fora do rol da ANS não está descartada, mas ficará muito mais condicionada a provas técnicas e documentais robustas. Um simples relatório médico, ainda que detalhado, não será suficiente.
Isso coloca sobre o consumidor (autor da ação) o ônus de comprovar todos os requisitos, o que pode exigir laudos médicos aprofundados, estudos científicos de referência, prova de registro na Anvisa e documentação do pedido administrativo junto à operadora.
Sem esse conjunto probatório, aumentam as chances de indeferimento administrativo ou judicial do pedido.
Conclusão
O julgamento da ADI 7.265 pelo STF representa um marco para a saúde suplementar no Brasil. De um lado, garante que tratamentos inovadores e necessários podem ser cobertos mesmo fora do rol da ANS, desde que exista comprovação técnica sólida. De outro, estabelece barreiras contra decisões arbitrárias que poderiam comprometer o equilíbrio econômico-financeiro dos planos de saúde.
Para os consumidores, a mensagem é clara: qualquer pedido de cobertura fora do rol precisa ser cuidadosamente instruído desde a fase administrativa, sob pena de insucesso futuro em eventual ação judicial.
Advogados especializados em direito da saúde suplementar terão papel essencial nesse processo, auxiliando os beneficiários na coleta e organização das provas necessárias, bem como na estratégia jurídica adequada.
Aviso Legal: Este artigo tem caráter exclusivamente informativo e não substitui a análise individual de cada caso concreto. A decisão do STF aqui comentada pode ter interpretações diferentes conforme a situação específica do paciente, do contrato e do procedimento médico envolvido. Recomendada a consulta com advogado especializado antes de qualquer medida administrativa ou judicial.
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